NOSSOS HERÓIS FEITOS DE NADA!
Eu não sou de falar muito sobre astros pop, sejam cantores ou atores, pois tudo o que se diz sobre os tais redunda, quase que inexoravelmente, em clichês mais batidos do que uma tábua de pregos. Mas, às vezes, não podemos simplesmente calar, inclusive diante de cenas que, antes inusitadas e pitorescas, atualmente multiplicam-se como a prole de um coelho, dada à condição dos rumos que tomam conta de nossa pós-moderna sociedade. Refiro-me aos acontecimentos relativos à morte do cantor "Chorão", da banda Charlie Brown Jr. O que me leva a escrever estas linhas foi uma cena que vi no Fantástico - talvez um dos maiores programas da gigantesca máquina midiática de imbecilização das Organizações Globo -, com aquela velha tentativa medíocre e despropositada de dizer abobrinhas com a morte de alguém que, como "Chorão", é um "astro pop", uma "figura pública" um "herói" (para muitos), que protagoniza mais uma cena de velório precoce por não ter sabido viver:
-"O céu ficou mais alegre - Chorão foi para lá";
- "Valeu, Chorão! Você foi nos trouxe só alegria!";
- "Adeus, Chorão. Você foi cantar música punk no céu";
- "Chorão, você é um exemplo para a juventude desse país"
?!?!?!?!?!?!?!?!?!?!?!?!??!?!?!?!?!?......
Besteiras como essas se propagam aos montes, hoje, pelas Redes Sociais. O Facebook parece um mural de fãs do Charlie Brown Jr. e o falecido "Chorão" posa, hoje, como um verdadeiro "herói da geração Y", uma figura caricaturizada pela mídia como "só alegria", entusiasmo.... e não me surpreendo nem um pouco que nossos incrivelmente imaginativos produtores e diretores nacionais se embrenhem a angariar fundos (rsrs) para uma mega nova produção nacional... talvez até chamada criativamente de "Chorão".
Essa palhaçada se dá pois nos tornamos uma sociedade impossível, prezados. Isso mesmo: impossível. É impossível entendermos o que esta sociedade realmente quer. É impossível abrangermos os paradoxos sócio-filosófico-antropológico-morais que degladeiam-se nas mentes nos nossos analistas sociais... porque simplesmente é impossível. O que é "Chorão"? Bem, "Chorão" (e, agora, falo do "produto", da "peça", do "personagem" fabricado com forte intuito midiático) é um reflexo tosco de uma sociedade que não mais se reconhece no espelho. Um homem (morto com 43 anos) que se vestia ridiculamente, falava ridiculamente, agia ridiculamente... tentando de todas as formas esconder que era um quarentão. Até entendo o desespero de tanto, pelo "produto" de entretenimento que era.... mas, por trás do "produto Chorão" há o homem Alexandre Magno Abrão que, segundo sua mulher em entrevista num noticiário nacional, era viciado em cocaína, álcool e remédios de controle de ansiedade.
Antes que venham alguns "idiotas úteis" deste sistema abortivo da mente humana falar que "estou sendo hipócrita", "estou ´julgando´", "não tenho de falar coisa alguma, pois nada tenho a ver com a vida dos outros", quero dizer que, particularmente, nada tenho a ver mesmo com a vida de quem quer que seja. Mas, quando falo de sociedade, não falo de uma entidade abstrata, algo amorfo que encontra-se no "mundo das idéias" (como diriam alguns manuais de filosofia), sobre o qual falo fingindo não ser a realidade em que eu mesmo vivo. Não! Se falo de um fenômeno social, e da sociedade na qual estou inserido, então ponho-me como parte deste maquinário sociológico, sendo tão responsável por ele como qualquer outro que dele faça parte. E, na qualidade de líder religioso e professor, penso que a tarefa de pensar criticamente esta mesma sociedade não me é apenas apresentado, mas, de certa forma, imposto. Infelizmente, intelectuais, líderes religiosos, sociólogos e filósofos pensam tal como eu e muitos até "se coçam" para falar algo sobre um fenômeno social pop que varre a sociedade quando da morte de alguém feito "Chorão", mas se calam, acovardam-se ficando "em cima do muro", dada à censura invisível, velada, mas muito real do "politicamente correto". Quero lhes dizer que quem fica em cima do muro é gato!
"Chorão" - o produto - não foi outra coisa senão mais um ingrediente, de tantos que há, que na impessoalidade e aparente desconexão das coisas, morre pintado como um "menino bom, às vezes triste, que morreu ´sabe-se de lá o quê´". Esta patetice é o triste desfecho de uma vida que sai do anonimato ao estrelato numa época em que, para que vc brilhe nas constelações do show bus, é preciso que se "macaquie" de um linguajar próprio (mesmo que seja extremamente esdrúxulo), tenha um visual "chocante", saia do que é considerado "padrão" pelos próprios "padronizadores" e pose como alguém que, em si mesmo, denote propósito. Bem, qual era o "propósito" de "Chorão"? Acertou quem disse que era "não ter propósito algum", mas, o que mais me corrói o ínitimo é saber que isto tornou-se um valor heróico em nossa sociedade: não é realmente posar como "mau", mas é posar como "um nada", é "ser nada", é viver como se a vida inteira fosse "nada"... é dizer "nada com nada", é não tomar partido em nada relevante... é ser amigo do nada e dizer, em suas músicas ou filmes, que "nada é melhor que o nada". Ora, às vezes, um desses produtos midiáticos, cujo pacote esconde um ser humano ardente de propósito, sufoca o ser sobre o qual se sustenta; e, se o produto em si é nada, então o "nada" prevalece sobre o ser (humano), que começa a crer e viver baseado nas mentiras "do nada" que ele mesmo conta. Tudo na vida do sujeito redunda para um "nada" existencial, que termina com uma vida (sempre uma vida...) que vai "do nada a lugar nenhum". A morte de tais indivíduos, por fim, torna-se uma prova contundente de que nada vale cultuar o nada, pois, de nós "nada restará".
Isto provoca dois tipos de reação, cujos pólos encontram-se opostos, mas que, se vistos corretamente, revelam-se como curvas de um mesmo espectro: o primeiro é aquele que tenta apaziguar a nulidade da existência humana em uma religião de esquizofrenia espiritual da pesada, seja através de cultos irracionais dos mais diversos tipos, seja através de um ceticismo cínico que, finalmente, faz com que os incautos, que dele se vestem, pintem-se com um verniz de moralidade cristã, mas vivam cotidianamente com o fervor do deus Baco, voltados para as coisas interessantes a Baco, querendo, na verdade, que a vida transforme-se num imenso e ininterrupto bacanal. Baco é o "herói" entre os novos-antigos deuses, que insurgem-se teimosamente no ideário humano para serem absorvidos por eles, entronizados em seus corações, tornando-se, por fim, seus próprios senhores. Ora, como isto é o que cada vez mais gente quer - porque é o que vende, é o que dá certo, é o que funciona, é o que dá prazer -, então era, até pouco tempo, "cafona" discordar e dizer o contrário. Hoje, é um "crime". É algo "vil", "sórdido", "malignamente retrógrado" e "perigoso". Não demora para que surjam outros exemplos de "idiotas úteis", e até alguns protagonistas do pérfido palco do mundo do entretenimento atual, que aparecem como analistas experimentadíssimos, através de cujos palavrões e palavras chulas, tentam defender (a "verdade") de que não há verdade alguma, ou (dogmaticamente) que todo dogmatismo religioso é uma m.....; ou ainda que quem diz algo do tipo "Chorão era um drogado" é louco, imbecil, preconceituoso, hipócrita e um "mal social", alguém que tem a petulância de dizer que um viciado é um...... viciado!
Não há nada de bonito em cheirar cocaína, prezados. Assim como não há nada de sacrossanto, de intocável em ser gay, para que se tenha "orgulho gay", ou ser "prostituta" ou "vadia", a ponto de se fazer uma "marcha de vadias", nas quais mulheres, de todas as classe sociais unam-se pelo nobre propósito de poderem ser "vadias". Não há nada de imaculado em "fumar maconha", a tal ponto que se torne uma ofensa, um delito gravíssimo chamar aquele que fuma maconha de "maconheiro". Não, não. É preciso arrancar, destruir, dizimar o verdadeiro problema sócio-cultural que - vejam bem - "não é", para esse sistema abortivo, quem vende ou quem consome alucinadamente cocaína, ou quem passa o dia fumando maconha, ou quem bota as partes íntimas à mostra numa "parada do orgulho gay", ou quem se gaba num meio qualquer de comunicação de ser uma autêntica "vadia", mas, curiosamente, é quem defende a ("absurda") ideia de dizer que, quem se droga com cocaína e maconha é...... um drogado!!!! Aquele que está convencido de que pessoas que parecem gostar de outras do mesmo sexo não são necessariamente "gays" e, por fim, aquelas que admitem que nada, absolutamente nada há de "sagrado", de "puro", de "virtuoso" em alguém ser conhecida como prostituta, vagabunda, vadia.
E as escolas inundam-se cada vez mais de pessoas que ovacionam o (produto) "Chorão"! São as que adoram "frases rebeldes de efeito", são os mesmos "filhinhos de papai" que, depois de estudarem na França (muitas vezes, às custas do governo contra o qual lutarão pelo resto de suas vidas), vêm ao Brasil com um discurso que, de tão burramente hipócrita, beira a demência. Cazuza já cantava que seus "heróis morreram de overdose", na tentativa de "mudar o mundo". Apesar do niilismo eclipsador pelo qual passaríamos após o fim do período de Cazuza, é fato que ele, na mesma música, também dizia que queria uma "ideologia prá viver". Homens não vivem de meros mitos, prezados internautas. Os mitos podem até sustentar a racionalidade de poucas gerações, mas, é na crítica consciente ao mito que descobre-se que os deuses e heróis míticos reduzem-se a nada, pois foram criados no contexto do nada, para nada mais serem do que sustentáculos racionais dos vícios e vicissitudes humanas. Uma sociedade assim nunca subsistiu. Creio que não subsiste. Creio que, por mais que teime em impositivamente se perpetuar ante à demência humana, é, na verdade, uma sociedade impossível.
Um comentário:
Arthur, dizer que o Chorão " Um homem (morto com 43 anos) que se vestia ridiculamente, falava ridiculamente, agia ridiculamente..." não é uma reflexão pautada num certo tipo de "procustianismo", você conhece a mitologia de Procusto, não é? A simbologia de Procusto se baseia na intolerância ao diferente. Mas, acho que esse não é o seu caso, ou é? Arthur, já usei muitas vezes, em sala de aula, algumas letras do Chorão, para levarem os meus alunos a pensarem sobre a vida. Você acha que ele falava ridiculamente quando cantava: " Eles querem que você se sinta mal... Pois assim eles se sentem bem... Eu nasci pobre... Mas não nasci otário... Eu é que não caio No conto do vigário... Eu não vim pra me explicar...Eu vim pra confundir...Eu não vim pra me explicar..." Essas pequenas frases, pode ser tudo, menos ridículas. Acho que seu olhar, em relação a ele, não foi de filósofo, mas de um religioso, como você mesmo pautou "politicamente correto". Um abraço
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