Para quem tem 35 anos ou mais e que aprecia filmes inteligentes e bem conduzidos, sejam de terror ou não, o filme de terror de finais da década de sessenta "O Bebê de Rosemary" é daqueles que não se desatualizam. Dirigido pelo controverso Roman Polanski, cuja mulher, Sharon Tate, morrera num ritual macabro pelas mãos da trupe psicopática de Charles Manson, o filme é sobre a vida de um casal que se muda para um prédio normal, em Nova York, o agora famoso "prédio Dakota" e lida com estranhos vizinhos. Sem querer fazer mais do mesmo - pois existem inúmeras e muito boas críticas ao filme, nestes quase 50 anos após ser lançado -, o fato que aqui destaco e sobre o qual me detenho um pouco diz não só respeito à atualidade sinistra do filme, como o que vejo nele representado.
Na película, satanistas são representados como vizinhos normais, pessoas integradas à sociedade e que andam entre nós diariamente, Brilhantemente, o controvertido Roman Polanski mostra-nos um satanismo que, ao meu ver, é muito fiel àquilo que existe, de acordo com quem viveu o próprio satanismo tradicional. São pessoas que vivem, conscientemente, não com piercings e à música de rocks estridentes e psicodélicos satânicos, mas sob a égide da mais perfeita aparência de boa vizinhança. Sedentos de poder, mas meticulosos e pacientes, aqueles bruxos que orquestram um ritual, drogando Rosemary para que ela tenha relações com o Demônio e engravide, gerando o "Filho das Trevas", o Anticristo, raptam a criança e deixam Rosemary (interpretada pela atriz Mia Farrow - foto abaixo) às cegas, sem saber o que é realidade ou delírios esquizofrênicos, os quais é levada a acreditar que adquiriu. Com o marido aliciado pela seita de bruxos, posto que fora-lhe prometido vir a ser um grande ator, Rosemary encontra-se só, confusa, atordoada, sem saber o que é desequilíbrio, loucura ou realidade.
Porém, o que choca, contudo, é o final. Não pelas bobagens holywoodianas costumeiras de filmes recentes do gênero. Rosemary, na trama, há muito desconfia de seus vizinhos, aparentemente "inocentes", mas algo em si diz-lhe que eles são maus, mais que apenas sinistros. Após ter dado a luz, ela encontra uma passagem para o apartamento vizinho a partir do seu e, com uma faca em punho, vai até lá, apenas para encontrar seu marido e todos da seita de velhos bruxos satanistas, alguns mais jovens, recebendo outros bruxos do mundo inteiro, radiantes, finos e educados, bem como uma criança em um berço preto. Ao se aproximar da criança, Rosemary percebe que seus olhos são vermelhos, e as pupilas como de uma serpente. Ouvindo gritos de "Satâ vive; Deus está morto", primeiramente desnorteada e horrorizada, ela é então persuadida a cuidar a criança e, devagar, aproxima-se do berço, balançando o infante devagar para que pare de chorar e olhando com ternura para quem ela sabia ser o "Filho das Trevas", revelando-nos, pelo olhar, que aceitou a empreitada.... ainda que soubesse de quem também era aquela criança.
É neste carrossel de sentimentos aos quais a personagem principal é submetida que está a genialidade distorcida de Polansky, encontrando eco em um telespectador que, no mais da vezes, é pego desatento, envolvido pela apatia espiritual de nosso tempo, posto que nós, como Rosemary, temos nos tornado inconsequentes com as implicações das decisões que tomamos. Do medo ao pavor, deste ao repúdio e do repúdio à condescendência, Rosemary ("Maria Rosa" ou "Rosa Maria", numa alusão clara à Maria, mãe de Jesus) parece representar a própria trajetória da humanidade moderna: distanciada de Deus, vive em um estado de torpor irreal, que, ocasionalmente se apresenta com a crueldade de quem, segundo a Escritura, domina-lhe com a máxima autoridade maligna. Mas, a humanidade, cética do que ela própria sente, vê-se cair em uma espiral de decadência para, ao fim, levada pelo "instinto" da adequação e adaptabilidade, finalmente ceder à força daquele que se lhe apresenta com com o poder e indulgência de um falso deus.
Nada melhor para representar tudo isso do que a dissonância do tema musical do filme, criado por Krzysztof Komeda, que com improvisos e mistura cadenciada de ritmos, tudo embalado por uma "canção de ninar", faz-nos pensar (com medo), como parece que estamos sendo conduzidos para um terrível e dramático desfecho, não da história de um filme, mas de nossa própria história como raça.
OBS: que a glória do que se nos foi conquistado na cruz do calvário resplandeça sobre todos os que se encontram sob a crescente e forte influência das trevas, que a todos tenta sobrepujar. Tal intento, ao fim, terá sido em vão (Ap. 21:1-4)!
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