Pesquisar no blog

segunda-feira, 28 de abril de 2008

Davi: poucas dúvidas em relação à sua historicidade

ARQUEÓLOGOS TENTAM DESVENDAR DETALHES HISTÓRICOS DO REINO DE DAVI, DE ISRAEL, EM 1000 A. C.



Davi e Golias em pintura do gênio renascentista Caravaggio

A narrativa bíblica sobre a ascensão de Davi, o jovem pastor que virou rei de Israel, preserva memórias históricas valiosas de uma época em que chefes guerrilheiros dominavam o sul da Palestina, protegendo ou extorquindo os vilarejos da região. A tese é defendida por uma dupla de arqueólogos, para quem a saga de Davi foi, na origem, a história de um “Robin Hood” que deu certo, tornando-se o fundador de uma dinastia.


O israelense Israel Finkelstein e o americano Neil Asher Silberman têm uma visão complexa e cheia de nuanças sobre a maneira como a Bíblia narra a chegada do pastor israelita ao poder. De um lado, eles avaliam que o texto bíblico se baseia em tradições orais vindas do ano 1000 a.C., quando Davi viveu. Por outro lado, segundo eles, a arqueologia mostra que o reino de Davi teria sido pequeno e relativamente insignificante, ao contrário do que as descrições de esplendor no Antigo Testamento dão a entender.

Histórico, sem dúvida
Ao contrário do que acontece com outros personagens do antigo Israel, como Abraão ou Moisés, é relativamente difícil questionar a existência histórica de Davi. Embora não existam inscrições contemporâneas que façam referência ao rei, textos não muito posteriores achados na Palestina parecem mencionar seu nome.

O menos controverso desses artefatos é a chamada estela de Tel Dan, descoberta ao norte da Galiléia. “Estela” é o termo empregado para designar uma espécie de coluna ou placa de pedra, muito usada na Antigüidade para celebrar eventos como grandes vitórias militares. A estela de Tel Dan, de fato, tem inscrições comemorando uma vitória – só que de um dos inimigos de Israel, os reis de Damasco.

No texto em aramaico (língua “prima” do hebraico), o rei de Damasco se gaba de sua vitória sobre “Acazias, filho de Jorão, rei da Casa [dinastia] de Davi”. A data estimada do texto fica em torno de 830 a.C. Ou seja, ele registra que a dinastia de Acazias, um século depois da época em que Davi teria vivido, dizia que ele era o fundador de sua “casa”. (Lembro ao leitor que, à esta época, como menciona a Bíblia, Israel havia se dividido em dois reinos: o do "Norte" (Israel), com 10 tribos, e o do "Sul" (Judá), com duas tribos. No século IX a.C., a época da inscrição desta estela, os dois reinos ainda contavam com a linhagem davídica. Depois, a linhagem davídica só continuaria no reino de Judá. O reino do "Norte" teve várias dinastias até o cativeiro assírio, que iniciou em 722 a.C. - grifo nosso)

A estela de Tel Dan, achada no norte de Israel, traz um texto aramaico com a possível menção mais antiga ao nome de Davi fora da Bíblia

Memórias antigas
Finkelstein e Silberman vão além. Ao analisar a lista das cidades e vilarejos israelitas citados na história bíblica de Davi, bem como a principal cidade dos filisteus (grupo étnico inimigo dos israelitas) na narrativa, eles afirmam que esses detalhes só poderiam remontar a memórias genuínas do século 10 a.C., uma vez que a geografia da região mudou radicalmente depois disso.

O que isso tem a ver com o retrato de Davi como uma espécie de guerrilheiro, “Robin Hood” ou mesmo “Lampião” palestino? Tudo, diz a dupla. No Primeiro Livro de Samuel, conta-se que Davi é forçado a fugir de seu antigo amo, o rei Saul, que quer matá-lo por inveja. O jovem pastor vai para o deserto no território de Judá mas, como já estava famoso por matar o gigante filisteu Golias, acaba atraindo seguidores.

E todos os que estavam em desespero, e todos os que tinham dívidas, e todos os que estavam descontentes se uniram a ele, e Davi se tornou o líder deles. E estavam com ele uns quatrocentos homens”, diz a Bíblia. A partir de então, Davi e seus guerreiros levam uma vida nômades, escapando de Saul, defendendo os vilarejos de Judá dos ataques dos filisteus mas também cobrando “proteção” por seus serviços. O ex-pastor chega mesmo a se tornar vassalo do rei Aquis de Gath, a mais poderosa cidade dos filisteus, e divide com ele os despojos de batalha que consegue. (Curioso como a reportagem, quando menciona tais registros bíblicos, toma tais registros como se fossem completamente verossímeis! Observem. Por que ´exatamente´ estes registros ´seriam reais´ e os demais registros passíveis de dúvida?? Porque a ênfase da reportagem, obviamente, NÃO é a confirmação da veracidade histórica da Bíblia, mas o destaque a posicionamentos não ortodoxos e nos supostos pontos em que se registram os ´defeitos´ dos heróis bíblicos. Mas, é justamente isso que faz da Bíblia um livro verossímel: ela, diferentemente dos relatos das conquistas dos povos circunvizinhos a Israel, não menciona apenas as virtudes e heroismos dos homens que fizeram a história ali registrada; ela também fala de seus medos, problemas, desafios, desvios, enfim, de sua humanidade! Isto faz da Bíblia um confiável registro histórico!! Grifo nosso)

Ora, todos esses detalhes só fariam sentido no século 10 a.C. Para começar, nos séculos após a vida de Davi, toda a região se tornou densamente povoada, o que tornaria impossíveis as fugas para o deserto retratadas no texto – o herói basicamente não teria para onde correr. Além disso, a cidade filistéia de Gath foi destruída pelo rei de Damasco no século 9 a.C. e nunca mais foi importante na Palestina. Só faria sentido retratá-la como poderosa se o autor bíblico tivesse acesso a tradições da época de Davi.

Dos ricos aos pobres
Em todas essas aventuras, Davi e seus homens são descritos como guerreiros altamente móveis e rápidos, que atacam de surpresa, saqueiam o que for possível (levando parte de sua presa para os vilarejos que protegem) e voltam para seu esconderijo em regiões ermas. Para Finkelstein e Silberman, essas características ligam Davi e companhia a um misterioso grupo social da Palestina, os apiru ou habiru.

Os apiru aparecem principalmente em cartas escritas pelos chefes das cidades-Estado de Canaã (nome antigo da Palestina) aos faraós egípcios, que dominaram a região como sua província por séculos. Como Davi, os apiru eram membros das camadas pobres da população que, por um motivo ou outro, viam-se forçados a abandonar suas comunidades e virar bandidos ou mercenários.

Vários chefes apiru acabaram reunindo tanto seguidores, e se tornaram tão bem-sucedidos como guerrilheiros, que viraram reis. Seria o caso de Davi: ao virar o protetor dos vilarejos de Judá e conquistar Jerusalém (que até então não era uma cidade israelita), o ex-pastor teria conseguido assumir o status real e criar sua dinastia. (Lembrando que, como dizem as Escrituras, , Davi, obedientemente, só assume o status de rei após ser ungido por Samuel, o sumo-sacerdote, e mesmo assim somente após a morte de Saul, o primeiro e desobediente rei de Israel - grifo nosso).

As duas mortes de Golias
Como todo bom herói popular, Davi virou o centro de uma grande quantidade de canções e narrativas folclóricas, algumas das quais incorporadas na Bíblia. A mais famosa é sem dúvida a vitória contra o gigante filisteu Golias, morto pelo então jovem pastor com apenas uma pedra.

O curioso é que, vários capítulos depois da narrativa do confronto, o texto bíblico volta a descrever façanhas dos guerreiros que acompanhavam Davi. Um deles é um tal Elcanan, “o belemita” (ou seja, de Belém, a mesma cidade onde Davi nasceu), que teria matado um guerreiro filisteu chamado... Golias. E a descrição da lança de Golias nessa passagem é igual à que aparece na luta contra Davi.

Pedaço de cerâmica do século 10 a.C., achado em Gath, a cidade de Golias, com nomes inscritos que lembram o do gigante guerreiro

Para alguns estudiosos, a explicação mais provável é que a história da morte do gigante originalmente tinha Elcanan como herói, mas foi “atraída” para Davi por causa da fama posterior do rei. De um jeito ou de outro, é interessante que escavações recentes no lugar onde ficava a antiga Gath (cidade natal de Golias) acharam um fragmento de cerâmica em que estão escritos nomes filisteus muito parecidos com o do gigante.

Império ou “cacicado”?
Nos últimos tempos, um dos debates mais ferozes entre os arqueólogos que estudam o antigo Israel tem a ver com o tamanho e a influência do reino de Davi. Seguindo a Bíblia, tradicionalmente se acreditava que o ex-pastor teria fundado um império abrangendo toda a Palestina, a Jordânia e regiões dos atuais Egito e Síria. O problema é que, na época em que Davi teria vivido, a região de Judá parece ter tido uma população pequena e pouco densa. Havia muitos grupos nômades e apenas umas 20 cidades ou povoados fixos, enquanto a parte norte de Israel tinha centenas de assentamentos permanentes. A própria Jerusalém não teria mais do que alguns milhares de habitantes.

Para Finkelstein e Silberman, isso significa que Davi nunca teria governado todo o povo de Israel, mas apenas a pequena Judá, ao contrário do que diz a Bíblia. Mas nem todos concordam com essa avaliação. Um dos que apostam num reino davidíco relativamente extenso e poderoso é Baruch Halpern, professor de história antiga e estudos judaicos da Universidade do Estado da Pensilvânia (EUA).

“O que você tem com Davi, e especialmente com Salomão [filho e sucessor do rei], é uma evidência crescente de intervenção central e de planejamento nos assentamentos. Temos formas parecidas de arquitetura pública, fortificações e, o que é bem significativo para o antigo Oriente Próximo, nada de templos entre essas construções”, declarou Halpern ao G1. A falta de templos é importante porque, no relato bíblico, esse é um sinal da centralização do culto a um só Deus em Jerusalém.

Halpern também diz acreditar que o reino davídico revela um aumento da alfabetização e do uso da escrita na corte. “Não era um estado gigantesco, mas era pelo menos um estado recém-nascido”, afirma ele, rebatendo a idéia de que o governo de Davi era no máximo um “cacicado” ou regime tribal.

Fonte: G1

Em Cristo Jesus,
Pr. Artur Eduardo

Nenhum comentário:

Ofertas Exclusivas!!!!