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sábado, 20 de julho de 2013

Uma crítica ao cientificismo reducionista moderno - Parte 1

"EU NÃO ACREDITO EM DEUS PORQUE NUNCA O VI NEM O OUVI": UMA CRÍTICA AO CIENTIFICISMO REDUCIONISTA MODERNO (PARTE 1)



Por Artur Eduardo
Não é de admirar que atualmente vejamos pessoas apresentarem-se cada vez mais frequentemente afirmando frases como a do título deste post. E estas mesmas pessoas creem que prestam um serviço enorme à racionalidade moderna ao propagar seu ceticismo materialista, posto que este é o posicionamento considerado mais sensato, pois, há séculos, viemos aprendendo a reduzir o conhecimento à esfera do sensível. Este é um ponto que, infelizmente, tem suas raízes no naquilo que chamamos de "modernidade", em cujas bases se deu o surgimento do cientificismo moderno. Negligenciados, consciente ou inconscientemente, séculos de aprendizado e desdobramentos metafísicos, os homens lançaram-se a um escrutínio filosófico que restringiria o que viria a ser o próprio modelo do que poderia ou não ser conhecido. E o que é "possível" de ser conhecido, em termo lato, seria aquilo que pode ser "mensurável". Os empiristas ingleses, sendo o mais proeminente David Hume, deram uma enorme contribuição em direção à tal consolidação do "conhecimento" a partir do século XVIII. Contudo, o próprio Hume, com sua crítica relativa às ligações de causalidade, destrói os fundamentos do mundo redutível que ele mesmo cria. Quando fundamenta que as aparentes e inquestionáveis relações de causalidade existentes na natureza são mais um produto de nossa própria prospecção do que uma característica intrínseca do mundo em si, foi, então, um dos próprios idealizadores do ceticismo moderno, o cético David Hume, quem jogou a pá de cal sobre os alicerces a partir dos quais este admirável mundo novo erguer-se-ia.

Hoje, no chamado "meio científico", um festival de paradoxos impede que se vejam as incongruências de muitas das normas pelas quais o próprio "meio" existe. A religião, depois do Positivismo lógico e das muitas "escolas" filosóficas que este produziu, é relegada à supersticiosidade ou, no máximo, à mania pessoal. Tende-se, hoje, a cercear-se toda e qualquer tentativa de se insurgir contra tal stablishment científico, que, diga-se de passagem vem "chiquemente" blindado pelo serviço midiático que parece estar incondicionalmente a serviço do que o reducionismo estabeleceu (até metafisicamente) como "verdade". O hilário - e paradoxal - nisso tudo é que são a mídia e o stablishment científico que vangloriam-se de serem procuradores e arautos da verdade e que, para isso, seus proponentes deveriam supostamente ser os de mentes abertas. Porém, tal abertura parece destinar-se apenas à sua forma de ver o mundo, ou seja, através do viés reducionista que, há 300 anos, auto-estabelece-se como a única fonte confiável de se ter acesso à verdade. Mas, antes de qualquer coisa, devemos nos perguntar: o que queremos dizer com a verdade?



Ora, se a verdade dos fatos no mundo me é compreendida exclusivamente como um punhado de fatos observáveis, como defendem beligerantemente alguns dos cientificistas de plantão, inclusive os midiáticos, então surgem problemas antes os quais não vale a velha vista grossa. Por exemplo: o problema de outras mentes. Sabe-se, há tempos, que outras mentes não são observáveis no sentido redutível a que se propõe o cientificismo moderno. Quando se estabelece um modelo que explique o mundo, seja ela lógico, metafísico-epistêmico, redutível ou irredutível (não importa), mas que explique melhor este mundo, não há motivos de nos apegarmos a um dado modelo, mesmo que este modelo explique melhor alguns aspectos do mundo. Creio que é exatamente esse o problema do cientificismo moderno. Ele explica bem uma gama muito específica de fatos do mundo e vale-se de uma falácia lógica informal para restringir a impossibilidade de compartilhar o monopólio da verdade, ou seja, o argumento da ignorância. Sendo assim, quando se depara com algo que lhe é inexoravelmente estranho (digo em relação ao conjunto de que dispõe para explicar os fatos no mundo), vale-se de uma premissa malandra, que pode ser mais ou menos explícita da seguinte maneira: "A ciência ainda não consegue explicar tal ou tais fato(s), mas não significa que não poderá explicar um dia pelos moldes como explica outros fatos, hoje". Ok, ok. Concordo que poderá explicar um dia... mas nada assegura que poderá fazê-lo! A crença cega de que o fará é um aspecto que está presente nos adeptos do cientificismo moderno assim como nos mais fanáticos religiosos, que negam-se a observar qualquer possibilidade de equívoco naquilo que pensam ser um edifício intelectual isento de falhas. 

Até hoje, por mais redutíveis que os homens possam ser, nunca conseguiram explicar convincentemente o problema de outras mentes, problema esse que vez ou outra desemboca novamente nas rodas de discussão filosófica de onde surgiu. Sabe-se muito bem, hoje,  graças à curiosidade do mundo natural que é incentivada pelo cientificismo, que a mente humana é mais do que física e química: são interações, a capacidade da memória e as incrivelmente complexas relações que fazemos ao nos dispormos da mesma. A mente humana, como demonstrou Descartes no século XVII, só pode chegar à certeza fundamental da existência do Sujeito através de uma metodologia racional, e não é à toa que o Autor das "Meditações Metafísicas" o fez com brilhantismo e inovação. O próprio método cartesiano - como viria a ser conhecido -, que tornar-se-ia para alguns uma espécie de normatizador do processo de conhecimento moderno, é um método racional que não pode ser provado pelo cientificismo, um de seus primos, frutos do racionalismo moderno do século XVIII. É interessante notarmos isso: aqui encontramos outro ponto que não pode ser provado pelo cientificismo moderno, que é a própria grade de fundação por onde são entretecidos os rudimentos do edifício intelectual do reducionismo científico! Como algo que se propõe a ser uma teoria de tudo, pelo menos em teoria (perdoem-me o trocadilho...), não consegue fundamentar, pelos métodos que julga absolutos, a si própria? 

A resposta a estes paradoxos do cientificismo empirista, que parecem existir "sem problemas" nas mentes reducionistas modernas, só pode ser dirimida mediante um recurso que está fora do próprio escopo destes paradoxos, a despeito da conveniente indiferença que se lhe asseguram. O tal recurso a que me refiro é a conclusão de que há padrões/leis/princípios que são estabelecidos ´a priori´, sem os quais a própria construção do conhecimento torna-se impossível. Sendo assim, quando o filósofo diz "Penso, logo sou (existo)", só está dizendo (ou pensando) isso porque é possível que venha a pensar. Assim como é possível que outro pense no que ele está pensando, sendo a possibilidade da existência um critério anterior à própria existência. Mas, pode-se perguntar: não poderíamos entrar numa armadilha psicológica, simplesmente relegando as possibilidades a um regresso infinito, um fosso racional do qual não poderíamos sair jamais? Explico: se é possível que pensemos, então pensamos porque é possível. E a possibilidade da possibilidade? Devemos inferir que existe. Assim, infere-se que deve existir também a possibilidade da possibilidade da possibilidade da existência. E assim ad infinitum. Os reducionistas cientificistas têm horror ao infinito e creio que não precisamos nos valer de nenhum truque metafísico para explicarmos a necessidade racional. As condições de possibilidade, portanto, têm de ser fixas, imutáveis, auto-estabelecidas, não apenas como condições físicas adequadas à existência das coisas como são, pois, desta forma, mesmo que admitamos um conjunto de infinitas possibilidades de possibilidades de existência, ainda assim deparamo-nos com o problema da causalidade de Hume, que retira toda lógica intrínseca dos processos naturais e a joga para o fundo de nossas mentes: se, na verdade, as coisas não têm uma causa intrínseca, quem disse que o mundo como nós o projetamos - inclusive esta própria discussão - tem uma causa específica? Apesar de, sensatamente, Hume ter afirmado que no dia a dia precisaríamos, sim, acreditar nos nossos sentidos e nas relações "aparentes" de causalidade, estava aberta a caixa de pandora epistemológica, ou seja, que destruiria nosso último senso de certeza do mundo. 



É claro que o cientificismo reducionista, como tudo o mais, seria reduzido apenas a relações aparentes, não necessariamente verdadeiras, e não é à toa que, daí, surja um ceticismo ainda mais fundamental, que encontra-se no âmago do pensamento moderno e pós-moderno. É este ceticismo que norteará, inclusive, os valores, os costumes, a própria ética, as relações humanas em seu sentido macro e micro. O comportamento humano como um todo será levado, desde fins do século XIX e por todo o século XX a um novo paradigma de relativismo, o qual viria a influenciar pensadores, escolas filosóficas, civilizações inteiras e, inclusive, as escolas teológicas mais recentes. Incrivelmente, alheios a tudo isso, vários teólogos parecem fechar-se num mundo cada vez mais "mecanizado" das fórmulas teológicas, excluindo-se a si próprios de discutirem e apontarem o legado da teologia na formação do mundo moderno, talvez por inépcia, covardia ou soberba suas, mas o fato é que a teologia segue excluída das matérias humanas que tentam explicar o que é a verdade dos fatos no mundo. Alheia às teorias da linguagem, da mente, às novas psicologias e ao próprio desdobrar das humanidades, a teologia restringiu-se às igrejas, ou seja, àquelas comunidades que querem ouvir algo do que os teólogos têm a dizer porque já creem nos princípios que aqueles teólogos creem! É por isso que hoje a teologia está completamente excluída do cenário social, político, cultural e científico (observe que eu me refiro à teologia, e especificamente a cristã, e não à religião. Há uma diferença enorme: quando uma personalidade como o Papa fala em cadeia nacional de televisão, os analistas correm e esmeram-se para interpretar os objetivos e desdobramentos políticos, sociais e culturais que aquela determinada fala terá....nunca os teológicos). 

Mas, seria a teologia um instrumento com alguma capacidade de contribuição à busca pela verdade no mundo? E em relação à própria verdade... percebe-se que o cientificismo reducionista moderno não é (simplesmente não é) a melhor maneira de se explicar o fato no mundo, pois, por mais que avance, não poderá explicar, por seus próprios moldes, as bases filosóficas sobre as quais ele próprio foi construído. Esta impossibilidade paradoxal deve fazer com que os homens busquem um sistema melhor, que não negue os avanços práticos do próprio cientificismo, mas que reconheça suas limitações e, por conseguinte, sua falha em se apresentar como o melhor sistema para se explicar a realidade, ou melhor ainda, a verdade dos fatos no mundo. Num próximo momento estaremos expondo a importância de atentarmos à lógica teológica como um meio mais abrangente, coeso e, ao contrário do que se diz, racional e com a capacidade de abranger perspectivas mais específicas - como o próprio cientificismo -, bem como lançar luz nos fundamentos em que ela própria está balizada  O importante aqui, relembro, é compararmos a proposta da teologia filosófica cristã com o cientificismo reducionista que estabelece-se há 300 anos como "o melhor e mais confiável método de busca e obtenção da verdade dos fatos no mundo". Será mesmo?

CONTINUA.....

Um comentário:

Jamesson João disse...

E quanto a crença na própria ciência, muitos deles (cientistas) tem pressupostos religiosos... o que os irrita por descobertas recentes, principalmente sobre a origem do universo e sua constituição. o peso de autoridade não interfere no reconhecimento dessas verdades religiosas?

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