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terça-feira, 15 de setembro de 2009

Erros na Bíblia?

ANÁLISE DO LIVRO "O QUE JESUS DISSE?, O QUE JESUS NÃO DISSE?", DE BATH EHRMAN - A BÍBLIA ESTÁ, DE FATO, CHEIA DE ERROS E CONTRADIÇÕES?


Por H. L. Nigro
Adaptado por Artur Eduardo

Em O que Jesus disse? O que Jesus não disse?, Bart Ehrman parece, superficialmente, apresentar uma tese convincente para a falta de fidelidade do Novo Testamento baseado nas mudanças dos manuscritos antigos durante o processo de cópia dos copistas, particularmente no segundo e terceiro séculos. Infelizmente, ele não é sempre o estudioso objetivo que ele mesmo afirma ser. Este trabalho, enquanto provê um documentário interessante sobre a disciplina do criticismo textual, somente conta metade da história.

Embora Ehrman saiba que a maioria esmagadora destes erros de cópia são aqueles (tais como os erros de ortografia) que são, em suas próprias palavras, “completamente insignificante[s], imateria[is], de pouca importância” (p. 217)[1], ele repetidamente passa rapidamente por cima deste ponto crítico e focaliza , em vez disto, as muito mais escassas adições e alterações intencionais, as quais a maioria já foi removida das nossas modernas traduções, ou mesmo que preservadas, têm pequeno ou nenhum impacto na doutrina cristã.

Adicionalmente, Ehrman freqüentemente deturpa o corpo da moderna erudição como que concordando com ele em matérias controversas quando, na verdade, alguns dos mais importantes estudiosos do Novo Testamento – incluindo o próprio mentor de Ehrman, Bruce Metzger – discordam dele. Apesar disto, ao final de seu livro, Ehrman admite que “pesquisadores competentes … altamente inteligentes chegam a conclusões opostas” (p. 218); até então, ele usa o termo inclusivo “pesquisadores” ou “muitos pesquisadores” para apoiar suas conclusões, ainda que raramente seja verdade.

É particularmente perturbador quando Ehrman especula sobre o assunto da autenticidade baseado em sua própria opinião ou reação pessoal quanto ao texto ao invés de [basear-se em] qualquer evidência histórica (por exemplo, ele visualiza diferenças secundárias de um evangelho para outro como tentativas deliberadas de alterar a mensagem e apresenta uma diferente visão da história) e, então, posteriormente em seu livro, deixa de chamar estas declarações “de especulações” para declarações “de fato”.

Pegue, por exemplo, sua argumentação de que Mateus e Lucas deliberadamente “apagaram” referências às emoções de Jesus (tais como compaixão ou ira, dependendo da variação lida que alguém escolha) na cura do leproso em Marcos 1.41. Por causa de que Ehrman prefere a leitura de que Jesus estava mais irado do que compassivo, ele argumenta que as descrições mais esparsas de Mateus e Lucas foram tentativas deliberadas de ocultar o que ele consideraria um fato embaraçoso. A argumentação de Ehrman ignora claramente o problema que, se os escritores do evangelho tinham inclinação para remover fatos embaraçosos, eles teriam ocultado os fatos muito mais embaraçosos deles, tais como a rejeição de Jesus por parte de Pedro, a incredulidade de Tomé, e o fato da tumba vazia ter sido descoberta por mulheres. Se eles deixaram estes fatos embaraçosos, porque eles deixariam fora do seu caminho algo tão inócuo quanto aqueles? Mais importante ainda, a argumentação de que isto é uma omissão deliberada (desta forma colocando dúvida nos motivos dos escritores) é uma interpretação pessoal que se sobrepõe ao texto – e completamente sem base nos fatos.

Rejeição subjetiva

Ironicamente, Ehrman usa seu treinamento em criticismo textual como a base para rejeitar a fé cristã. E, ainda, mesmo na própria admissão tácita de Ehrman, nenhum exemplo dado no livro toca o núcleo do ensino cristão.

Certamente, algumas adições dos copistas apóiam as afirmações do Novo Testamento sobre a divindade de Cristo, por exemplo; mas há um excesso de referências, incluindo as próprias palavras de Jesus, que não estão sob suspeita. E nenhuma destas discrepâncias coloca em xeque o coração da mensagem cristã, incluindo os detalhes relativos à morte expiatória, julgamento e ressurreição de Cristo, as quais formam o coração da fé cristã. Não somente isto, mas a confirmação dos pontos-chave dos relatos evangélicos podem ser encontrada em antigas crenças pré-Paulinas, as quais aparecem antes dos evangelhos ou epístolas serem escritas (a crença encontrada em 1 Coríntios 15, por exemplo, é comumente crida que ela apareceu dentro de uns poucos anos depois da morte de Cristo[2]), e nos escritos da Igreja antiga, tanto quanto em documentos seculares do primeiro e segundo séculos.

Curiosamente, Ehrman quase admite que o que importa não são os fatos da matéria, mas suas acusações pessoais (as quais são tão importantes que ele as faz na primeira e na última página do livro); que se a Bíblia foi realmente inspirada por Deus, então Deus teria preservado suas palavras originais perfeitamente através da história. Nenhum copista teria feito um simples erro ou uma simples mudança em qualquer ponto do tempo:

"Pois a única razão (pensava eu) de Deus inspirar a Bíblia seria para seu povo ter as suas palavras reais; mas se ele realmente queria que as pessoas tivessem suas palavras reais, certamente poderia ter preservado miraculosamente essas palavras, assim como primeiramente as inspirara milagrosamente. Dadas as circunstâncias de que não preservou as palavras, a conclusão me pareceu inevitável: ele não se deu ao trabalho de inspirá-las". (p. 221)

Isto explica porque, na mente de Ehrman, as menores e mais secundárias discrepâncias tiraram a sua fé do caminho. Não que a evidência realmente aponte para os documentos do Novo Testamento como não confiáveis em transmitir verdade histórica, mas antes porque Deus não atingiu os padrões pessoais do próprio Ehrman.

Através da lente da ofensa

Esta, no seu núcleo, é a lente através da qual Ehrman visualiza sua pesquisa. Isto é claro, não somente em suas justificativas, mas em sua teologia. Muitas das afirmações de Ehrman de que as mudanças no texto são significativas à teologia cristã, realmente refletem o que parece ser uma compreensão superficial do texto.

Em outros lugares, seus problemas quase parecem manufaturados. Pegue o exemplo do aparente “erro” de Jesus quando Ele diz, em Marcos 4, que a semente da mostarda é “a menor de todas as sementes da terra”. Respondendo ao corpo do trabalho de harmonização destas passagens, Ehrman escreve, “[...]talvez eu não precise arrumar uma explicação extravagante de como o grão de mostarda pode ser a menor das sementes quando sei perfeitamente que não é” (p. 20). Antes que conclua que Jesus proferiu uma asneira embaraçosa, não seria mais racional assumir que Jesus não estava fazendo uma declaração científica, mas antes estava a ferramenta comum do exagero para fazer um ponto importante – a comparação do tamanho da semente com a majestade da planta completamente desenvolvida? Para Ehrman ver isto como um erro antes do que como uma óbvia figura de linguagem sugere uma forte tendência através da qual ele interpreta o texto.

Esta tendência resplandece tanto através do restante do parágrafo quanto na lista de Ehrman, uma coleção de “contradições”, após cada uma das quais ele afirma que, antes de aceitar a harmonização, “talvez haja realmente uma diferença”. A resposta óbvia é “e talvez não haja”. Os exemplos que Ehrman dá são bem conhecidos dos estudiosos do Novo Testamento, e a maioria – se não todos – são facilmente harmonizados. Então nós ficamos com a solução fácil? Ou nós rejeitamos a solução mais intuitiva e focamos ao invés disto a menos intuitiva – que Jesus, que é comumente citado, mesmo por aqueles que não aceitam sua divindade, como o mais sábio homem que já viveu e que habitou em uma cultura de fazendeiros e agricultores, cometeu um erro grosseiro sobre o tamanho de uma semente comum?[3]

Por último, o que isto resume é a falta de respeito de Ehrman pela mensagem do Novo Testamento. Isto também é claro em suas incorreções nas citações bíblicas. Ocasionalmente, as referências bíblicas são rasteiramente incorretas. Em outros casos, se alguém ler a passagem a qual Ehrman está se referindo, ela nem sempre diz o que Ehrman afirma. Se Isto é um resultado de sua própria lambança ou resposta ao texto emocionalmente carregada, novamente ressalta uma questão acerca de sua objetividade.

De qualquer modo, sobre o quê o Cristianismo está baseado?

Com todas as coisas consideradas, há uma tremenda ironia aqui. Eu duvido que qualquer estudioso questionaria a discussão de Ehrman sobre os manuscritos em si. As alterações dos copistas são bem conhecidas, e que poucas “principais” modificações foram feitas ao texto são também bem conhecidas – mesmo para, ”hã, hum”, outros estudiosos do Novo Testamento – mas a despeito do propósito declarado do livro como uma introdução ao criticismo textual para leigos, é a conclusão que Ehrman formula que é a verdadeira mensagem do livro. Essas conclusões são altamente subjetivas, e é nas suas conclusões que muitos dos maiores estudiosos do Novo Testamento do mundo distinguem-se das visões dele.

A maior ironia é que Ehrman rejeitou sua fé no cristianismo bíblico no que ele vê como problemas irreconciliáveis com o texto; e, contudo, a fé cristã nunca foi baseada na perfeita preservação das traduções do Novo Testamento. É baseada no testemunho ocular do Cristo ressurreto, o qual é um dos eventos mais bem atestados na história antiga, com ou sem alterações dos copistas, e mesmo fora da Bíblia. Poderiam desaparecer todos os documentos do Novo Testamento, porém a historicidade do Cristo ressurreto, crucificado por nossos pecados e adorado pelos antigos cristãos como Deus, permaneceria intacta (veja The Historical Jesus, por Gary Habermas).

Uma ironia final é que, enquanto Ehrman pesquisou estes textos e rejeitou sua fé, muitos dos grandes intelectuais do nosso tempo têm olhado para as mesmas evidências e têm realmente fortalecido suas fés ou se tornam crentes pela primeira vez. Eu mesmo tomo algo muito diferente das evidências de Ehrman do que ele aponta, e realmente deleito-me com o livro e planejo adicioná-lo à minha biblioteca apologética apoiando a fé cristã – em grande parte, suspeito, para seu desapontamento.

Fonte: Apologia

NOTA: Como professor e estudante de apologética cristã posso assegurar que Ehrman é, no máximo, um dos que parecem querer ganhar dinheiro com ataques à autenticidade histórico-teológica da Bíblia, já que desde os anos 90 esta prática vem ganhando vulto. Vários "best-sellers" neste período focaram justamente o que acabei de escrever, e os mais sabichões do ramo editorial tem-se aproveitado disto ao máximo. Ehrman tem toda a pinta de um que se enquadra neste perfil: esconde-se atrás de um título; é ovacionado pelos que pensam como ele; é superficialíssimo em muitas de suas conclusões, além de econômico quanto às referências que apoiem suas principais premissas.

Uma coisa tem me chamado à atenção em praticamente todos os que se destacam, atualmente, como baluartes do ateísmo ou do agnosticismo: sua pretensão em apresentar ao grande público questões que (na melhor das hipóteses, já foram exaustivamente debatidas antes dos mesmos), segundo tais proponentes, aparecem em seus respectivos sucessos editoriais como exclusivamente identificadas e questionadas por tais autores. A negligência da sociedade moderna com a crítica e o bom senso impedem que falácias como estas se propaguem. Muitos desses homens são "deificados" pelo grande público leigo. Contudo, qualquer seminário que se preze jamais chamaria Dawkins ou Sam Harris, por exemplo, para uma palestra sobre as razões filosóficas do ateísmo, uma vez que estes (que, repito, são alguns dos maiores proponentes do ateísmo atual) mostram, em seus escritos e declarações, um conhecimento no máximo "ensosso", superficial e estudantil acerca da historicidade de Jesus, por exemplo.

Em Cristo Jesus,
Pr. Artur Eduardo

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